Burnout: Um ano de oficialização como síndrome ocupacional

O formato de trabalho atual, com telefones e dispositivos eletrônicos conectados o tempo inteiro, vem gerando um estresse e esgotamento mental que antigamente não existiam. Para acompanhar as mudanças nas relações de trabalho, desde janeiro de 2022, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu o burnout como uma doença crônica associada a fatores que influenciam o estado de saúde. Agora, um ano após a oficialização da doença como uma síndrome ocupacional, o que mudou?

De acordo com Karen Valeria da Silva, coordenadora de Psicologia da Docway, empresa pioneira em soluções de saúde digital no Brasil, a principal mudança foi o direcionamento técnico para o diagnóstico. “Antes, tudo era tratado como um quadro depressivo ou de estresse. Agora, com a inclusão de critérios específicos para o diagnóstico, realizar uma decisão clínica com um plano de tratamento assertivo fica muito mais direcionado”, comenta.

O burnout é classificado como uma síndrome multifatorial, ou seja, um conjunto de sinais e sintomas que identificam um quadro clínico, entre eles estresse, depressão, diminuição da autoestima, ansiedade e falta de produtividade, sempre associados ao trabalho. “os sintomas podem repercutir em diversos âmbitos da vida, mas em análise aprofundada durante o psicodiagnóstico é possível perceber o papel do ambiente de trabalho no desencadeamento ou potencialização desses sintomas”, explica.

De acordo com Karen Valeria da Silva, coordenadora de Psicologia da Docway, a principal mudança foi o direcionamento técnico para o diagnóstico

No universo corporativo, a preocupação com a doença também avançou. “A pandemia já havia acendido um sinal de alerta para as doenças relacionadas com a saúde mental. Com a introdução do burnout no CID, essa preocupação tornou-se mais evidente nas empresas, visto que agora faz-se um diagnóstico mais preciso, impactando em uma série de questões, como a produtividade do colaborador, um período de afastamento, ou até mesmo implicações jurídicas caso o quadro clínico não seja tratado com respeito e seriedade”, aponta.

Contudo, na prática, a situação ainda tem muito para melhorar. “Já começamos a quebrar o paradigma cultural brasileiro de resistência e preconceito com tratamentos psicológicos, mas os números mostram que precisamos ir além”, sugere. A psicóloga ressalta que, numa visão corporativa, ações preventivas e de promoção da saúde são muito mais baratas que perder um funcionário, além de serem um chamariz para novos colaboradores. “Hoje, muitos profissionais já buscam esse cuidado e preocupação como o valor de uma organização em que deseja atuar. Desenvolver esse cuidado internamente pode ajudar a empresa a atingir maior satisfação de seus colaboradores e, também, alcançar um melhor posicionamento de mercado”, finaliza Karen.

Fotos:  Divulgação 

Quando um familiar assume o papel de cuidador do idoso

Por Marcelo Valadares*
Neurocirurgião da Unicamp e do Hospital Albert Einstein

As doenças neurodegenerativas, caso da doença de Alzheimer, trazem mudanças para a saúde física e mental dos pacientes, além de alterarem, muitas vezes, a rotina das famílias. Com o avanço da condição e agravamento do quadro, pode ser que o paciente precise de acompanhamento contínuo de alguém da família ou de um profissional de saúde para ajudá-lo com as tarefas do dia a dia. Eis que entra então um ator fundamental neste cenário: o cuidador.

Não é incomum que parentes mais próximos do paciente assumam esse papel. Para tanto, essas pessoas costumam deixar de trabalhar ou abdicam de outras funções para cuidar da mãe ou do pai idoso. Como médicos, é nossa função nos atentarmos para as necessidades dessa pessoa, educando, valorizando e acolhendo esse cuidador.

Com o aumento da expectativa de vida da população, esse importante ator da cadeia de cuidados vem ganhando protagonismo. Se há condições econômicas, essa função é executada por uma equipe de profissionais de enfermagem, mas, no meu consultório, ainda vejo muitos familiares que assumem essa importante função.

Encarar o posto de cuidador quando se é próximo ao paciente, não é uma tarefa simples. O primeiro desafio é quando nos deparamos com a troca de papeis, quando deixamos de ser filhos para nos tornarmos pais dos nossos genitores. É compreensível estranhar a situação, afinal podemos ter em mente o fato de que o envelhecimento é uma etapa de vida como as demais, mas a finitude, embora seja o destino de todos, é assustadora.

Outro ponto a se ressaltar é que esse cuidador não pode ser o único responsável pelo paciente. Muita se fala do burnout no universo corporativo, mas essa pessoa elencada para dedicar-se aos cuidados com uma pessoa enferma, seja um parente ou profissional, também sofre dessa síndrome, em que o estresse e o desgaste levam a esgotamento mental, quadros de depressão e crises de ansiedade.

Ter uma rede de apoio é fundamental para evitar sobrecargas físicas e mentais. É necessário entender que essa pessoa precisa de alguém para substitui-la em plantões, idas a consultas médicas e divisão de tarefas domésticas e administrativas.

Ninguém está preparado para acompanhar o agravamento da saúde de qualquer ente querido, nem as alterações cognitivas e comportamentais que fazem às vezes com que o paciente com Alzheimer não reconheça os familiares mais próximos. É um exercício de paciência, resiliência, de desenvolvimento da inteligência emocional e, muitas vezes, de afeto.

Por isso, uma forma de atenuar essa situação é engajar-se num grupo de pacientes, sempre um importante apoio para essas pessoas. No Brasil, temos a Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz), o Oncoguia destinado a pacientes com câncer, a Casa Hunter dedicada a doenças raras, entre outras instituições que fazem um trabalho excelente de divulgação de conhecimento, empoderamento e acolhimento.

Ledo engano achar que quem cuida não adoece, ainda mais quando existem fortes laços afetivos com o paciente. Sessões de terapia ou mesmo com o médico psiquiatra também podem ajudar. Enfim, precisamos lembrar sempre sobre a importância desse cuidador e respeitá-lo com carinho e muito amor.

* Marcelo Valadares é neurocirurgião, médico da Disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Hospital Israelita Albert Einstein.

Fotos:  Autor – Divulgação | Ilustrativa – Pixabay