Expedição na bacia do rio Branco busca identificar se peixes estão contaminados por mercúrio

Para tentar revelar os níveis de contaminação dos peixes por mercúrio e riscos ao consumo humano, uma equipe multidisciplinar formada por profissionais do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) realizou uma expedição para coletar amostras de peixes e de água na bacia do rio Branco, em Roraima, no período de 29 de outubro a 9 de novembro de 2018.

Os trabalhos foram coordenador por Bruno Souza do ICMBio e Fabíola Domingos Moreira, do Inpa. Foram coletados peixes nos rios Branco, Mucajaí e Uraricoera, incluindo a compra de pescado nos mercados de peixe das cidades de Caracaraí e Mucajaí. Mais de 2 mil amostras de tecidos, escamas, nadadeiras, sangue e órgão vitais foram coletados de 240 peixes. O resultado sobre a possível contaminação dos peixes por metais pesados deve sair em 180 dias.

Conforme o pesquisador Romério Bríglia, do ICMBio/RR, a pesca é uma atividade importante no estado, com mais de 6 mil pescadores profissionais atualmente em atividade, sendo esta uma fonte expressiva de alimento e de renda em Roraima.

“A pesquisa é importante pois irá avaliar a presença de mercúrio e a ocorrência de efeitos prejudiciais à saúde dos peixes, sendo que essa contaminação pode refletir em redução do pescado para a população”, destacou Fabíola Domingos Moreira.

De acordo com o analista ambiental Bruno Souza, o estudo contribuirá para a implementação de um protocolo de monitoramento de metais pesados. “Esse protocolo será fundamental para a conservação dos ambientes aquáticos da
Amazônia e manutenção da qualidade do pescado da região”, ressaltou.

O metal pesado mercúrio é utilizado no garimpo de ouro sendo liberado no ambiente e atingindo os rios e igarapés. Estudos anteriores realizados pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) já revelaram que parte da população
Yanomami que vive nas proximidades das áreas de garimpo já se encontra contaminada por mercúrio.

O Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Amazônica (Cepam) do ICMBio, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Instituto de Amparo à Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de Roraima (IACTI-RR), a Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e a Universidade Federal do Amazonas (Ufam) são instituições parceiras da iniciativa que foi financiada com recursos do Ministério do Meio Ambiente por meio do Programa ARPA – Áreas Protegidas da Amazônia.

Histórico

Roraima tem uma característica única: é banhado quase que exclusivamente por uma só bacia hidrográfica, a bacia do rio Branco. Historicamente, o Estado tem enfrentado ondas de crescimento da atividade garimpeira ilegal em seus domínios, principalmente em terras indígenas, e à montante da capital, Boa Vista, que concentra mais de 65% da população residente no Estado.

No final dos anos 1980 do século passado, ocorreu um boom dessa atividade, quando mais de 30 mil garimpeiros adentraram na área que seria homologada como terra indígena Yanomami apenas em 1992, quando se decidiu pela
retirada dos garimpeiros e a explosão das pistas de pouso que apoiavam a atividade. Mas de alguns anos pra cá a área foi novamente invadida e o garimpo recrudesceu, agora com mais intensidade, e com o uso de máquinas e
tratores com um potencial de alterar os ambientes de forma ainda mais devastadora. A preocupação com o retorno do garimpo está em saber quais seriam os reais impactos dessa atividade para o meio ambiente e para as populações locais.

Foto: Fabiola Valdez/Inpa

Filtro feito com bactérias purifica biogás para uso veicular em Santa Catarina

Pesquisadores da Embrapa Suínos e Aves (SC) desenvolveram um biofiltro, tecnologia que utiliza bactérias para purificar o biogás gerado a partir dos dejetos suínos das granjas. O produto é alinhado ao conceito de energias renováveis e aproveita resíduos da produção animal. O resultado do processo é um biogás com baixos teores de enxofre, que pode ser usado para geração de calor, energia elétrica ou mesmo combustível veicular para substituir gasolina ou óleo diesel.

O processo de biofiltragem foi resultado de pesquisas de um projeto para desenvolver a biofiltragem com a finalidade de gerar energia elétrica a partir de biogás oriundo de dejetos de suínos no município de Itapiranga (SC), que teve o apoio financeiro das empresas Eletrosul e Uirapuru Transmissora de Energia.

O biogás gerado a partir dos dejetos suínos tem alta concentração de sulfeto de hidrogênio, ou gás sulfídrico (H2S), que é o responsável pela corrosão de metais e motores. Esse gás diminui a vida útil de geradores de eletricidade, deteriora queimadores e impossibilita o uso veicular como biometano.

O biofiltro promove a redução na concentração desse componente em mais de 90%. “A dessulfurização do biogás permite o seu uso direto, tanto para aquecimento em caldeiras como para geração de energia elétrica, ou também favorece a purificação posterior no caso do biometano e uso veicular, que é o caso da demonstração que estamos efetuando na Embrapa”, explica o analista Ricardo Luís Radis Steinmetz, um dos responsáveis pelo desenvolvimento da tecnologia.

O equipamento, que está sendo validado em escala de produção, faz parte da Unidade de Produção de Biometano, conhecida como BiogásFORT, e foi apresentado pela Embrapa ao público no dia 30 de outubro. “O objetivo da Unidade é demonstrar a rota tecnológica e a oportunidade de uso do biogás gerado a partir dos resíduos da suinocultura como matéria-prima para produzir combustível veicular”, destaca o pesquisador Airton Kunz, chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Suínos e Aves e responsável pelo projeto.

Carro a gásA Unidade de Produção de Biometano da Embrapa Suínos e Aves é a primeira em Santa Catarina e uma das primeiras no Brasil nessa escala para uso como combustível veicular. Depois de passar pelo processo de dessulfurização e purificação, o biometano é usado para abastecer um dos veículos da frota da Embrapa Suínos e Aves.

A tecnologia é semelhante à usada em veículos movidos a GNV e segue regulamentações como as Resoluções ANP Nº8, de 30.01.2015 (DOU 2.2.2015), e ANP Nº 685, de 29.6.2017 (DOU 30.6.2017). Além disso, atende diversos compromissos com a produção de energia a partir de fontes renováveis. Um desses compromissos está vinculado ao Objetivo de Desenvolvimento Estratégico – ODS 7 – Energia Limpa e Acessível.

Para a chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves, Janice Zanella, a rota tecnológica apresentada reforça o compromisso da Embrapa com a sustentabilidade.

O diferencial da Unidade de Produção de Biometano está justamente na possibilidade de uso do biofiltro, que faz o processo inicial de purificação do gás usando o próprio dejeto de suíno tratado e garante conformidade para a etapa de purificação, que produz o biometano.

Bactérias limpam o gás

A vantagem da tecnologia da Embrapa é que o processo de purificação é biológico, ou seja, a remoção do H2S ocorre por meio da ação de bactérias oxidadoras de sulfeto, sem necessidade de uso de insumos. O processo utiliza o próprio efluente do dejeto suíno e gera enxofre elementar, que pode ser usado como fertilizante.

Em processos convencionais, essa purificação pode ocorrer de maneira química, com lavagem com soda, ou física, com inserção de carvão ativado. “Nos dois casos, ainda temos uma questão de manejo dos produtos, que podem ser prejudiciais ao produtor e ao meio ambiente. Já o resíduo do biofiltro pode ser reaproveitado”, explica Steinmetz, salientando que a tecnologia é sustentável e segura.

O segundo passo da Unidade de Produção de Biometano para a geração de combustível veicular é a purificação do biogás dessulfurizado. Nessa etapa, ocorre a retirada de umidade por resfriamento e a compressão. O sistema tem capacidade de produzir 9 a 12 Nm³/h de biometano. Depois de produzido, o biometano é armazenado no reservatório, com capacidade de 50m³, com pressurização de cerca de 210gkf/cm². O projeto executivo da Unidade de Produção de Biometano da Embrapa Suínos e Aves tem parceria da Janus & Pergher e Kemia Tratamento de Efluentes.

O uso veicular do biometano ocorre na sequência e segue os mesmos procedimentos de abastecimento de GNV. De acordo com Steinmetz, com 15 m³ de biometano é possível estimar uma autonomia de 230 a 300 km rodados por um veículo com esse sistema. Para gerar essa quantidade de gás já purificado são necessárias cerca de 300 matrizes suínas. “Essa é uma estimativa, uma vez que estamos tendo como base a nossa granja de suínos e temos o processo em escala de pesquisa”, compara.

“É um combustível produzido a partir de uma fonte renovável, substituindo a fonte fóssil, e sem impacto para o meio ambiente”, reforça Kunz.

Foto: Monalisa Pereira/Embrapa SC

Conservação na Amazônia focada somente em carbono pode desproteger a biodiversidade

Proteger os estoques de carbono nas florestas tropicais, em especial na Amazônia, é um dos principais objetivos de políticas públicas e ações de organizações ambientais em todo o mundo na luta frente às mudanças climáticas. Porém, um estudo publicado no último dia 16 de julho na Nature Climate Change, principal revista sobre o tema no mundo, mostra que a conservação focada somente no carbono pode levar à perda de até 75% da biodiversidade presente nas florestas de maior valor ecológico.

O trabalho, liderado por pesquisadores da Embrapa Amazônia Oriental (PA) e do Centro de Meio Ambiente da Universidade de Lancaster, no Reino Unido, partiu da seguinte questão: as medidas de proteção ao carbono nas florestas tropicais também garantem a sobrevivência das espécies de plantas e animais nesses locais?

A resposta a essa pergunta é complexa, mas os pesquisadores descobriram que os investimentos destinados a evitar perdas maciças de carbono em florestas tropicais são menos eficazes para a biodiversidade nas florestas de maior valor ecológico. Ou seja, nessas florestas (que são as mais preservadas) a riqueza de espécies da biodiversidade não está protegida quando se considera somente os estoques de carbono.

“Proteger os estoques de carbono das florestas tropicais deve permanecer um objetivo central em políticas de conservação e restauração florestal. No entanto, para garantir a manutenção da riqueza de espécies dessas áreas, a biodiversidade precisa ser tratada também como foco central desses esforços”, alerta a pesquisadora Joice Ferreira, da Embrapa Amazônia Oriental, uma das autoras principais do artigo.

Carbono e biodiversidade

Para chegar às principais conclusões, a equipe passou 18 meses realizando medições do conteúdo de carbono e da variedade de espécies de plantas, pássaros e besouros em 234 áreas nos municípios de Paragominas e Santarém, no Pará, região da Amazônia Oriental. Foram analisados quatro tipos de florestas: primária com pouquíssima ou nenhuma intervenção humana; floresta com extração madeireira; floresta com extração madeireira e queima; e floresta secundária, aquelas que já passaram por intervenções e estão em processo de recuperação.

A equipe descobriu que mais carbono significava mais biodiversidade em florestas severamente danificadas, principalmente naquelas secundárias e as que sofreram a extração da madeira e a queima. Por outro lado, naquelas áreas onde os impactos humanos eram menos intensos, as quantidades crescentes de carbono não eram acompanhadas por mais riqueza de espécies. Na prática, os crescimentos dos estoques de carbono e de biodiversidade caminham juntos nas áreas mais danificadas, mas o mesmo não acontece nas áreas mais preservadas.

Para a pesquisadora Joice Ferreira, a mudança na relação entre carbono e biodiversidade entre as florestas que sofreram diferentes níveis de distúrbios provocados por ação humana explica os resultados encontrados. Conforme as localidades desmatadas e altamente perturbadas se recuperam dos efeitos da exploração e de incêndios florestais graves, a biodiversidade também se recupera. No entanto, essa relação direta entre carbono e biodiversidade perde-se na etapa intermediária da recuperação. O resultado: as florestas com o maior teor de carbono não abrigam necessariamente a maioria das espécies.

“Isso acontece porque nas áreas onde a ação humana é mais intensa, a perturbação é o principal fator que dirige as características das áreas. Então, carbono e biodiversidade se recuperam concomitantemente. No entanto, em uma floresta sem ação humana, por exemplo, os fatores que governam as características das plantas e dos animais são diversos, como o tipo de solo, a luminosidade, as chuvas, a competição entre espécies e outros. Por isso, nesse caso, carbono e biodiversidade não são correspondentes”, explica a especialista.

Foco duplo

As florestas tropicais armazenam mais de um terço de todo o carbono terrestre do mundo. Fenômenos causados por ação humana, como o desmatamento e as perturbações florestais (extração seletiva de madeira, caça, incêndios e fragmentação florestal) podem provocar a liberação do carbono e exacerbar os efeitos do aquecimento global. Por essa razão, a proteção do carbono das florestas tropicais é uma das principais metas das iniciativas internacionais de combate às alterações climáticas, atraindo dezenas de bilhões de dólares em financiamento todos os anos.

“As medidas de proteção aos estoques de carbono não apenas podem desacelerar os efeitos das alterações climáticas, como também têm o potencial de proteger a vida selvagem única e insubstituível das florestas tropicais. Mas para isso é fundamental colocar a biodiversidade no mesmo patamar de importância do carbono”, afirma Gareth Lennox, um dos autores principais do estudo e pesquisador da Universidade de Lancaster.

Toby Gardner, pesquisador do Instituto Ambiental de Estocolmo, na Suécia, e também coautor do artigo, explica a importância de se ter uma abordagem de conservação mais abrangente. “Ao considerar carbono e biodiversidade juntos, descobrimos, por exemplo, que o número de espécies de árvores grandes que podem ser protegidas aumenta em até 15% em relação à abordagem com foco somente no carbono.”

A pesquisa oferece diretrizes para o alinhamento dos esforços de conservação de carbono e biodiversidade, especialmente em ações de restauração florestal. “Os resultados podem orientar o governo na escolha de áreas prioritárias para programas de recuperação de florestas, para a compensação de passivos ambientais”, destaca Joice Ferreira, da Embrapa.

“Embora algumas perdas sejam inevitáveis, os conflitos de estratégia entre o carbono e a biodiversidade podem ser reduzidos por um planejamento mais integrado em nível territorial”, pondera o cientista da Universidade de Lancaster, Jos Barlow, um dos coautores da pesquisa.

Foto: Embrapa/Secom

Fórum mundial discutirá em Brasília uso sustentável do fósforo

O uso adequado do fósforo na agricultura estará no centro dos debates científicos entre os dias 20 e 22 de agosto, em Brasília (DF), durante o 6º Encontro Sustentável do Fósforo (SPS2018), fórum de âmbito mundial. A Embrapa é uma das organizadoras dessa edição do evento, que acontece pela primeira vez no hemisfério sul e cujas inscrições continuam abertas.

Um recente estudo publicado por pesquisadores da Embrapa Solos (RJ) e de outras instituições brasileiras revelou que quase metade do fósforo aplicado na agricultura em forma de fertilizante inorgânico nos últimos 50 anos no Brasil continua fixada no solo. Esse legado, que representa 22,8 milhões de toneladas do insumo ainda na terra, avaliados hoje em mais de U$ 40 bilhões, pode ajudar o Brasil a se precaver contra uma possível escassez futura do nutriente ou variações no preço. Em 2008, por exemplo, o valor de mercado da rocha de fosfato aumentou 800% em um período de 18 meses.

“Pretendemos mostrar um cenário mais realista do uso do fósforo no Brasil para o mundo”, revela Vinicius Benites, chefe-adjunto de P&D da Embrapa Solos. O SPS 2018 também discutirá os cenários na Ásia, África e Pacífico, com enfoque nos desafios e oportunidades dessas regiões.

Entre os palestrantes já confirmados estão Tom Bruulsema, do International Plant Nutrition Institute (IPNI), no Canadá; Per-Erik Mellander, do Johnstown Castle Environmental Research Centre (Teagasc), na Irlanda; e Dana Cordell, do Institute for Sustainable Futures (UTS), da Austrália.

Os encontros para discutir o uso sustentável do fósforo começaram em 2010, na Suécia. Os demais fóruns foram realizados nos Estados Unidos (2011), na Austrália (2012), na França (2014) e na China (2016). A edição brasileira reunirá várias lideranças da ciência, indústria e política, buscando identificar ações a respeito da disponibilidade e acessibilidade do nutriente na segurança alimentar e agricultura, protegendo o meio ambiente e apoiando a vida urbana e no campo.

Foto: Reprodução internet

Suco de tamarindo apresenta atividade contra triglicérides

O uso de um suco preparado com farinha de tamarindo promoveu uma redução de 24% na taxa de triglicérides de voluntários. É o que mostra um estudo que avaliou os impactos do uso do fruto no controle dos distúrbios bioquímicos associados ao diabetes. A pesquisa foi realizada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e Universidade Estadual do Ceará (UECE). Triglicérides, ou triglicerídeos, são um tipo de gordura presente no sangue que, em quantidades elevadas, aumenta o risco de doenças cardíacas e outros problemas de saúde, principalmente quando o colesterol também está alto.

O consumo do tamarindo também promoveu leves reduções no colesterol total, no índice de massa corporal e na circunferência da cintura dos voluntários. O estudo apontou ainda que o produto apresenta baixo índice glicêmico (IG). Esse indicador mostra o quão rápido um alimento ingerido consegue aumentar a glicemia (a glicose no sangue).

Participaram do experimento 164 adultos e idosos com diabetes, com peso adequado ou até leve obesidade. Do total, 82 pacientes apresentavam glicemia controlada e os demais, glicemia elevada. Durante quatro semanas, metade dos voluntários consumiu o suco preparado com a farinha de tamarindo e a outra ingeriu placebo.

Potencial

A intervenção contou com cinco encontros. A cada encontro, os voluntários recebiam envelopes com desidratado de tamarindo, para utilização ao longo da semana. Os pacientes passaram por consultas e exames para determinação do perfil glicêmico e lipídico, verificação da ingestão alimentar e avaliação antropométrica (medidas de peso, altura, circunferência da cintura e do quadril). Os resultados deixaram os cientistas animados. A equipe acredita que o produto pode ser utilizado como adjuvante para o controle do perfil lipídico de indivíduos com diabetes.

A pesquisadora Ana Paula Dionísio, da Embrapa Agroindústria Tropical (CE), esclarece que o estudo com alimentos funcionais busca o desenvolvimento de novos produtos que promovam benefícios à saúde dos consumidores. “Com esse tipo de resultado, temos condição de incentivar a população a consumir mais frutas. Com isso, incentiva-se também a produção”, completa o pesquisador Nedio Jair Wurlitzer, da mesma Unidade de pesquisa da Embrapa. A pesquisa foi financiada pela Embrapa e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Efeito específico

A nutricionista Tatiana Uchôa Passos, responsável pela etapa da pesquisa com os pacientes no Centro Integrado de Diabetes e Hipertensão (CIDH), diz que nenhum dos medicamentos distribuídos pelo sistema público de saúde no Brasil apresenta ação específica sobre o triacilglicerol (triglicérides) no sangue. Segundo ela, os remédios agem sobre o perfil lipídico como um todo, especialmente sobre o colesterol total. “Observando por esse aspecto, a utilização da farinha de tamarindo seria ainda mais interessante para aqueles pacientes cuja inadequação lipídica seja apenas nos triglicérides”, conclui a nutricionista que desenvolveu tese de doutorado sobre a pesquisa.

De acordo com Tatiana Uchôa, as demais variáveis investigadas ainda carecem de avaliação. “Diante da inovação proposta pela ideia desse projeto e da significância estatística encontrada com relação aos triglicérides, ficamos satisfeitos com os resultados e também instigados a dar continuidade aos estudos futuramente”, conta.

A nutricionista ressalta, ainda, que é necessário ter hábitos alimentares saudáveis para que, ao se consumir alimentos com atividade fitoterápica ou funcional, eles possam, de fato, ser aproveitados. “A fitoterapia possui resultados ainda mais evidentes quando associada a um plano alimentar saudável e individualizado”, afirma.

O consumo do tamarindo também promoveu leves reduções no colesterol total, no índice de massa corporal e na circunferência da cintura dos voluntários (Foto: Reprodução da internet)

Redução da acidez da fruta

Uma desvantagem do tamarindo é a elevada acidez, que provoca rejeição em um determinado grupo de consumidores. Para aumentar a aceitação de derivados da fruta, a Embrapa Agroindústria Tropical atua agora no desenvolvimento de um suco de tamarindo com acidez parcialmente neutralizada. “O tamarindo é muito ácido, e muitas pessoas rejeitam ou então diluem muito o suco”, diz a pesquisadora Ana Paula Dionísio.

Os pesquisadores também estão testando o tamarindo parcialmente neutralizado para averiguar se as propriedades benéficas serão mantidas. Esses testes estão em andamento com a parceria da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Paralelamente, a equipe do Laboratório Multiusuário de Química de Produtos Naturais da Embrapa avalia quimicamente os produtos, para investigar quais os componentes responsáveis pelos efeitos benéficos à saúde. “Se identificarmos que polifenóis atuam com as fibras, para o efeito na saúde, teremos a possibilidade de concentrar esses componentes e utilizar em um novo produto”, explica Nedio Wurlitzer.

Alimentos funcionais

O desenvolvimento da farinha de tamarindo e a avaliação dos efeitos em pacientes com diabetes fazem parte de uma linha de estudos com alimentos funcionais desenvolvida na Embrapa Agroindústria Tropical. De uma forma geral, o esforço de pesquisa, desenvolvimento e inovação nos estudos com alimentos funcionais começa com a identificação e caracterização de novos componentes bioativos aplicáveis em alimentos e suplementos alimentares. As pesquisas evoluem para o uso dessas matérias-primas no desenvolvimento de produtos comprovadamente funcionais, com formulações diferenciadas, versáteis e adequadas às necessidades dos consumidores.

Os pesquisadores observam como o processamento pode ampliar os efeitos desejáveis dos componentes bioativos, bem como a estabilização desses ingredientes para a produção de insumos industriais ou produtos finais. Quando necessário, são realizados ensaios de toxicidade, testes pré-clínicos e clínicos envolvendo células, animais e, por fim, grupos de consumidores, para avaliar e comprovar os efeitos benéficos à saúde humana.

Pesquisa encontra ômega 3 em vísceras de surubim e tambaqui

Estudo identificou ômega 3 nas vísceras de tambaqui (Colossoma macropomum) e do surubim (Pseudoplatystoma sp.). Normalmente utilizadas pela indústria de pescado na produção de suplemento para ração animal, produção de biocombustível e até como adubo, a descoberta abre a possibilidade para um uso mais nobre do resíduo, como a produção de cápsulas de ômega 3, espécie de gordura benéfica à saúde humana. O trabalho foi liderado pela Embrapa Pesca e Aquicultura (TO), com participação da Embrapa Agropecuária Oeste (MS) e Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ). Além de acrescentar valor à cadeia produtiva dos peixes, o aproveitamento das vísceras aprimora a sustentabilidade ambiental da produção.

Geralmente presente em peixes de águas gélidas, como salmão e bacalhau, mas também na nossa popular sardinha, o ômega 3 das vísceras do tambaqui é uma boa notícia para a cadeia produtiva do peixe nativo do Brasil. “É uma matéria-prima nobre que precisa ser melhor aproveitada”, atesta Leandro Kanamaru Franco de Lima, pesquisador da Embrapa Pesca e Aquicultura. Para o cientista, a descoberta deverá trazer um outro olhar para as vísceras resultantes do processamento de pescado. “O produtor deve ficar atento para não deixar o subproduto estragar com períodos longos de armazenamento, já que esses ácidos graxos encontrados podem gerar produtos de maior valor agregado”, aconselha o pesquisador.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2016 revelam que a produção nacional de tambaqui chega a 136.991 toneladas anuais e a de surubim alcança 15,86 mil toneladas. No entanto, o nível de desperdício e resíduos chega a mais da metade da produção, pois apenas cerca de 30% do total da carcaça é aproveitado em filés. Grandes empresas utilizam parte das sobras para produzir biodiesel ou ração animal.

O estudo revelou que, além do tambaqui, o surubim também pode ser fonte de ômega 3 para consumo humano (Foto: Reprodução)

Menos impacto ambiental e mais valor agregado

Segundo Kanamaru, o estudo da Embrapa busca apontar uma alternativa para cooperativas e pequenas empresas de processamento de pescado. “Se os resíduos sólidos, tais como carcaça e vísceras, fossem aproveitados pela pequena indústria para gerar um incremento para a ração de animais, por exemplo, a gente diminuiria o impacto ambiental e geraria maior valor agregado. O problema é que geralmente ele é descartado ou vira adubo”, ressalta ele acrescentando que, muitas vezes, devido aos custos de transporte, não é possível levar os resíduos para processamento em grandes empresas, gerando um problema para o entreposto e uma ameaça ao meio ambiente. Devido à baixa produção de vísceras, não compensa a montagem de uma graxaria para produzir biocombustível no próprio entreposto e os resíduos acabam voltando para o meio ambiente.

Silagem de pescado

Para minimizar o problema, a solução indicada é o reaproveitamento. “A silagem de pescado, que é um produto líquido produzido a partir de enzimas, é uma forma pouco onerosa e que independe da quantidade de sobras disponíveis. Para a sua elaboração, são utilizados os tecidos e as vísceras do pescado”, detalha Kanamaru, para quem a silagem pode se transformar em uma fonte proteica para a alimentação animal.

O pesquisador acrescenta que muitos frigoríficos nem aceitam receber as sobras de pequenas cooperativas porque não sabem as condições de conservação e armazenamento. “É um material muito perecível, e sua qualidade impacta diretamente no valor nutricional final”, explica.

Desperdício de material nobre

O pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, Ricardo Borghesi, ressalta que além de uso na ração há ainda outras alternativas de utilização e transformação de dejetos da indústria pesqueira em produtos de alto valor agregado, oferecendo benefícios sociais, econômicos e ambientais. “Podemos citar como exemplo de uso de resíduos o aproveitamento da pele do peixe como couro; para tratamentos de queimaduras humanas; extração de colágenos; gelatinas; hidroxiapatita (mineral usado para substituição de ossos humanos); farinha de peixe; hidrolisados proteicos; extração de óleo; biocombustível; composto orgânico, entre outros”, enumera.

A tendência é que, no futuro, haja o aproveitamento total do pescado, tal ocorre com o boi, do qual nada é descartado. De acordo com Borghesi, as possibilidades são muito amplas, mas seu uso depende do tipo e das quantidades de resíduos gerados, da matéria-prima utilizada (espécie de peixe, por exemplo) e das etapas de processamento.

O ômega 3 é encontrado em peixes de águas gélidas, como o salmão, e na popular sardinha, sendo bastante comercializado (Foto: Reprodução)

Para Borghesi, apesar do grande potencial de uso do material residual, algumas vezes esse recurso é desperdiçado pelos entrepostos de pescado. Ele acredita que essa pesquisa pode contribuir com a redução desse desperdício, pois o conhecimento gerado auxilia a direcionar melhor o reaproveitamento dos resíduos e contribui com o desenvolvimento de tecnologias que garantam produtos de alta qualidade e com maior valor agregado.

O engenheiro-agrônomo e instrutor do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) em Mato Grosso do Sul Maurício Xavier Curi destaca a importância da utilização de resíduos de peixes como forma de agregar valor aos produtos da piscicultura. “Infelizmente, os produtores da região do Mato Grosso do Sul não têm o hábito de aproveitar os resíduos. Aqui no estado, por exemplo, a maioria dos peixes produzidos é vendida para os frigoríficos e estes também não reaproveitam as sobras”, afirma.

Segundo Curi, algumas empresas vendem para outros estados e a cadeia produtiva local fica com uma lacuna no seu circuito produtivo. “As pesquisas desenvolvidas pela Embrapa abrem possibilidades de aproveitamento desses resíduos e podem contribuir com informações que venham a gerar mudanças relacionadas ao assunto”, acredita.

O estudo da Embrapa é parte de um projeto maior que analisou o gerenciamento hídrico da indústria do pescado, incluindo análise de efluentes líquidos e processamento, com análises microbiológicas e de resíduos sólidos. Os dados completos da pesquisa sobre análise nutricional dos resíduos estão disponíveis no Boletim de Pesquisa “Caracterização de Resíduos Gerados no Beneficiamento Industrial do Tambaqui (Colossoma macropomum) e do Surubim (Pseudoplatystoma sp.)”.

O projeto contou com recursos do extinto Ministério de Pesca e Aquicultura (MPA) e do Fundo de Recursos Hídricos (CT-HIDRO), com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Foto: Jefferson Christofoletti