Fiocruz traz conferência internacional sobre Ciência, Tecnologia e Inovação

A Fiocruz traz de 13 a 15 de fevereiro para o Rio de Janeiro a reunião anual da Comunidade Global de Tecnologia Sustentável e Inovação, a G-Stic, que pela primeira vez será realizada nas Américas. E como a Fundação é a principal co-anfitriã, a saúde ganha um grande destaque na G-Stic Rio.

Nomes como o de Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial de Saúde, Qu Dongyu, diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), ambos on-line, e Nísia Trindade Lima, ministra da Saúde, presencialmente, reúnem-se na ExpoMag para discutir o tema Por um futuro equitativo e sustentável: soluções tecnológicas inovadoras para uma melhor recuperação pós-pandemia.

“A Fiocruz, como principal organizadora desta edição, reforça sua participação em âmbito global na discussão de tecnologias e inovações sustentáveis, com uma visão de destaque para a saúde”, explicou Mario Moreira, presidente interino da Fundação.

Para Moreira, a realização da conferência no continente confere uma ênfase especial à questão das desigualdades globais e regionais em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I).

“Essa tem se revelado uma das fragilidades da capacidade internacional de articulação de resposta e preparação para emergências sanitárias. Equidade e sustentabilidade apresentam-se, nesse aspecto, como outros elementos definidores dessa capacidade”, acrescentou.

A lista de participantes reúne outros nomes de peso, como Macharia Kamau, diplomata queniano que foi o enviado especial da ONU para Implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem alcançados até 2030; Amandeep Singh Gill, enviado especial do secretário-geral da ONU para Tecnologia; e Maria Van Kerkhove, líder técnica da OMS para Covid-19. A lista segue com a ativista indígena Samela Sateré-Mawé e a princesa belga Marie-Esmeralda, presidente do Fundo Leopoldo III para a Conservação da Natureza, entre outros. A Fiocruz participa ainda com integrantes como o próprio Moreira; Marco Krieger, vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde; e Mauricio Zuma, diretor do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos).

“O mundo está diante de um grande desafio: a reconstrução pós-pandemia em bases sustentáveis, respeitando a equidade e a inclusão. E para fazer frente a esse processo, o grande referencial é a Agenda 2030, com os ODS”, explicou Paulo Gadelha, coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030 (EFA 2030) e à frente da organização da G-Stic Rio.

A conferência lida justamente com essa questão: pensar em como garantir tecnologias eficazes e sustentáveis visando os ODS. Gadelha lembrou que, apesar da proximidade de 2030, a grande maioria desses objetivos está longe de ser cumprida.

“O desafio que temos é como CT&I podem modificar esse cenário, quebrar assimetrias, garantir o acesso às tecnologias, em processos inclusivos. A pandemia nos deu exemplos disso, como nas vacinas contra Covid-19, que foram produzidas rapidamente, mas que ficaram inacessíveis à maioria da população”, avaliou.

Inicialmente capitaneado pelo instituto de tecnologia belga Vito, que mantém peso significativo no evento, a G-Stic reúne um conjunto de instituições com representações em todas as regiões do mundo. A entrada do Brasil em 2018, por meio da Fiocruz, deu uma relevância ainda maior para o tema da saúde, o que fica claro na programação de fevereiro.

“Um dos ativos únicos da G-STIC é sua perspectiva multissetorial e orientada para o futuro em CT&I. A G-Stic analisa clusters de tecnologia e identifica soluções que contribuem substancialmente para alcançar os princípios da Agenda 2030 e os ODS. Ela reúne partes interessadas de organizações multilaterais, governos, indústria, atores privados, sociedade civil e academia”, disse Dirk Fransaer, diretor-geral da VITO.

“Em sintonia com essa abordagem, a G-Stic Rio reconhece os princípios de solidariedade e ‘trabalho conjunto’ do relatório do secretário-geral da ONU Nossa Agenda Comum como fundamentais para acelerar a implementação dos ODS. A CT&I têm o potencial de catalisar o envolvimento da comunidade nesse processo. A próxima edição do G-STIC no Rio de Janeiro trará esse conceito de integração, solidariedade e multilateralismo entre setores, partes interessadas e países em um interesse comum”, acrescentou.

As sessões do evento se dividem em seis temas: Saúde, Educação, Água, Energia, Clima e Oceanos. Em Saúde, Bio-Manguinhos está organizando mesas sobre vacinas e imunização. O painel Desafios e Perspectivas para a produção local, nos dias 14 e 15, será dividido em quatro sessões que trarão especialistas como James Fitzgerald, diretor do Departamento de Sistemas e Serviços de Saúde da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas); Lieve Fransen, consultora sênior do Centro Europeu de Políticas em Saúde; Carla Vizzotti, ministra da Saúde da Argentina; e Tiago Rocca, vice-presidente do Conselho de Membros de Fabricantes de Vacinas para Países em Desenvolvimento (DCVMN); além de representantes de instituições internacionais de renome na área como Wellcome, CEPI e Medicines Patent Pool, OXFAM e MSF, entre outros.

Essa agenda tem como objetivo discutir fatores críticos de sucesso para produção local de vacinas em países em desenvolvimento, endereçando os desafios e perspectivas em relação a demanda e fornecimento, financiamento e perspectiva global em relação à propriedade intelectual e acesso.

As discussões envolverão os desafios sistemáticos de pesquisa & desenvolvimento e produção local de vacinas, abrangendo: desafios de saúde tendo em conta o cenário epidemiológico, doenças emergentes e reemergentes, experiências de financiamento da inovação e prontidão para respostas a emergências, os desafios de desenvolvimento de capacidades e financiamento da produção local, e equidade e acesso para assegurar a vacina e a vacinação para todos.

A conferência

Esta é a sexta edição da G-Stic. Considerada a maior conferência global de Ciência, Tecnologia e Inovação para aceleração da Agenda 2030, ela acontecia na Bélgica desde seu início, em 2017. Para aumentar a sua capilaridade, passou a ser realizada em outros países, acontecendo em 2022 durante a Expo Dubai. A Fiocruz, que participa como coanfitriã desde 2018, sugeriu então que a edição de 2023 ocorresse no Brasil.

A G-STIC é organizada em conjunto pela Vito (organização belga de pesquisa, tecnologia e desenvolvimento sustentável) e sete outros institutos de pesquisa sem fins lucrativos: Fiocruz, CSIR (Conselho de Pesquisa Científica e Industrial, África do Sul), Giec (Instituto de Conversão de Energia de Guangzhou, China), Gist (Instituto de Ciência e Tecnologia de Gwangju, Coreia do Sul), Nacetem (Centro Nacional de Gestão de Tecnologia, Nigéria), Teri (Instituto de Energia e Recursos, Índia) e SDSN (Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas).

No Brasil, a G-Stic Rio conta com o patrocínio master da Petrobras, Pfizer e Fiotec e com o patrocínio das empresas Aegea, IBMP, Instituto Helda Gerdau, Klabin, Sanofi, GSK, Enel, Engie, The Rockefeller Foundation, RaiaDrogasil e Firjan, além do apoio do Instituto Clima e Sociedade.

A programação pode ser conferida site da G-Stic Rio

Foto: Reprodução (Topo)
Ilustração: Divulgação

Estudo mostra impactos de 35 anos da hidrelétrica de Balbina em florestas de igapó da Amazônia

Um estudo liderado por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI) trouxe uma síntese de mais de 35 anos dos impactos causados pela construção da hidrelétrica de Balbina nas florestas alagáveis de igapó até 125 quilômetros rio abaixo da barragem. O estudo foi publicado recentemente na revista científica Aquatic Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems, tendo o pesquisador Jochen Schöngart como primeiro de um total de 22 autores, pesquisadores de instituições do Brasil, Alemanha, Holanda e Reino Unido. A publicação traz os detalhes das perturbações encontradas no espaço e no tempo na floresta de igapó, desde o início da construção da barragem em 1983, e um alerta para o que pode acontecer em outros pontos dos rios amazônicos, onde há mais de 400 barragens, operando, planejadas ou em construção.

A alteração mais nociva é o que os pesquisadores estão chamando de “efeito sanduiche”, no qual o “recheio” não é nem de longe saboroso. A pressão sofrida pelas florestas nas porções mais elevadas e mais baixas resulta na perda de habitats e na diversidade de árvores, com severos impactos nas cadeias tróficas, incluindo a alimentação de peixes, além da perda de importantes serviços ecossistêmicos. A pressão das porções baixas resulta dos elevados níveis mínimos de água durante o período de operação da barragem.

“Aproximadamente 12% das florestas de igapó já morreram e outras são ameaçadas se o modo operacional de construção das barragens continuar a alterar o regime hidrológico”, salientou Jochen Schöngart, que possui graduação e doutorado em ciências florestais. Essas árvores são espécies que estavam adaptadas ao regime regular e anual de inundação, como a Eschweilera tenufolia (conhecida como cuieira e macacarecuia), mas que após o barramento do rio Uatumã (150 quilômetros ao norte de Manaus) tiveram que lidar com inundações quase permanentes, acima da capacidade das espécies de tolerar tanto tempo debaixo d’água.

Nas topografias mais altas, as florestas de igapós foram afetadas pela invasão de espécies da terra firme que possivelmente são mais competitivas que as espécies de igapó. Nas topografias médias, houve um forte declínio da diversidade e, com isso, a dominância de algumas espécies arbóreas. Segundo o pesquisador, os distúrbios que causaram o impacto foram gerados durante o enchimento do reservatório (1983-1989) que resultou em condições de extrema seca nos igapós a jusante da barragem.

“Árvores das florestas alagáveis começaram a morrer por causa da falta de água. Possivelmente incêndios também afetaram os igapós neste período em que as condições secas geradas ainda foram potencializadas por eventos o El Niño (1982/1983 e 1986-1988), que diminuem a precipitação e tendem aumentar a temperatura e a umidade relativa do ar nesta região”, explicou.

A hidrelétrica de Balbina, no município de Presidente Figueiredo, é considerada um dos maiores desastres socioambientais da Amazônia, com impactos que vão além do reservatório e da barragem. O reservatório inundou uma área de quase 3.000 quilômetros quadrados, afogando florestas de igapó e de terra firme. Apenas os planaltos de terra firme em altitudes mais elevadas permaneceram, formando uma paisagem fragmentada de mais de 3.500 ilhas isoladas em um “cemitério de milhões de árvores mortas”, conhecidos “paliteiros”, e a produção ao longo dos anos de um grande volume de gases de efeito estufa, como o metano. A capacidade instalada prevista era de 250 MW, porém, desde o início das operações em fevereiro de 1989, Balbina nunca gerou energia suficiente para atender Manaus que atualmente consome dez vezes mais energia do que essa usina hidrelétrica produz.

Distúrbios espaço-temporais nas florestas alagáveis de igapó a jusante da barragem de Balbina ao longo de um período de 35 anos, resultando em perda de macrohabitats, mortalidade maciça de árvores e perda da diversidade de espécies arbóreas, afetando o funcionamento do ecossistema e o fornecimento de serviços ambientais

Recomendações

O artigo traz recomendações concretas para mitigar os impactos nas áreas alagáveis para as usinas hidrelétricas em fase de operação, construção e planejamento. Para as barragens em operação, os pesquisadores apontam mudanças no modo operacional, de forma que a liberação da água do reservatório simule o regime natural de baixas águas (índice de fluxo de base do período pré-barragem). Enquanto para as barragens em construção, deveriam ser evitadas condições de extrema seca nas áreas alagáveis a jusante durante a instalação, pois isso pode resultar em elevada mortalidade de árvores por falta de água ou por incêndios. “Isso é de extrema importância nos períodos atuais em que mudanças climáticas podem potencializar os impactos devido ao aumento de temperatura e de eventos extremos de secas”, afirma Schöngart.

Para as barragens planejadas, as áreas alagáveis deveriam ser consideradas no Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima), que hoje só leva em conta as áreas que serão impactadas pela construção da barragem e do reservatório. Com base nos estudos sintetizados pelos pesquisadores, o EIA/Rima deveria integrar áreas alagáveis até a confluência com um afluente da mesma ordem de rio sem impactos, ou até a confluência com um rio de ordem superior que amortece as alterações causadas pelo efeito da barragem hidráulica.

“Modelos que permitem simular o nível da água e a descarga do rio deveriam estimar a geração de energia hidrelétrica, condicionada ao modo operacional que simule o regime natural de águas baixas. Isso exige uma reavaliação de muitas barragens planejadas por um consórcio envolvendo os órgãos públicos do governo, cientistas, partes interessadas da sociedade civil, indústria e as agências financeiras para evitar ou pelo menos mitigar os possíveis impactos nas áreas alagáveis”, defendem os pesquisadores.

O estudo também deixa um alerta para a necessidade de políticas públicas eficientes voltadas ao desenvolvimento sustentável da região amazônica: “Precisam avaliar os impactos das barragens planejadas considerando o balanço entre geração de energia e a perda de biodiversidade e serviços ecossistêmicos que afetam as populações indígenas e ribeirinhas tradicionais, em particular, e a sociedade brasileira, em geral”, destacou Schöngart.

Acompanhamento e uso de modernas técnicas

Em 2009, ou seja, 20 anos após a usina iniciar sua operação, os pesquisadores observaram os paliteiros na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uatumã, dezenas de quilômetros a jusante da barragem de Balbina. Isso levou à formulação da hipótese principal do trabalho, de que as árvores morreram por causa da barragem. Os primeiros estudos tiveram início para buscar evidências. Essas atividades foram realizadas pelos participantes do Grupo de Pesquisa Ecologia, Monitoramento e Uso Sustentável de Áreas Úmidas (GP MAUA/ Inpa), sob coordenação da pesquisadora Maria Teresa Fernandez Piedade, por meio de vários projetos e cooperações, como o Programa LBA (Experimento de Larga Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia) e PELD (Pesquisa Ecológica de Longa Duração), financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), pela Fapeam (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas) e pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), de forma a permitir uma abordagem sistemática e abordar diferentes componentes da floresta (plântulas, árvores), em nível da espécie de árvore até a escala de paisagem. Os estudos tiveram apoio de parcerias dentro do Inpa (INCT-Adapta, Projeto Atto) e em nível nacional (INCT-Inau, Universidade Estadual Paulista, Universidade de Brasília) e internacional (Instituto Max-Planck de Química em Jena, Instituto Tecnológico de Karlsruhe, ambos na Alemanha), entre outras.

Para testar a hipótese principal e trazer evidências de distúrbios no passado, quando começou a instalação da barragem de Balbina, na década de 1980, os pesquisadores procuraram evidências destes impactos em séries históricas de dados hidrológicos, imagens de satélite e nas informações que as árvores armazenam no seu tronco em forma de anéis de crescimento que podem ser associadas aos anos calendários do passado por meio de datação de radiocarbono e dendrocronologia.

Em paralelo, foram feitos inventários e monitoramentos das florestas de igapó impactados em comparação com igapós sem distúrbios antropogênicos ao longo do rio Abacate, um afluente do rio Uatumã. E os estudos não param. Ainda estão sendo realizados e planejados experimentos em laboratório no Inpa (microcosmos/INCT-Adapta e casa de vegetação) sob condições controladas para obter mais informações sobre as características e respostas de algumas espécies de árvores que dominam os igapós após perturbações.

Após alcançar uma massa crítica de dados, evidências e informações, os pesquisadores elaboraram a síntese que permitiu reconstruir os distúrbios em espaço e tempo desde que a barragem de Balbina começou a ser construída até os tempos atuais. “Mais de dez anos se passaram desde a primeira observação até esta síntese para indicar recomendações concretas às políticas públicas baseadas em vários estudos capacitando alunos de diferentes níveis de formação acadêmica de diversos programas de
pós-graduação do Inpa. A formação de recursos humanos é fundamental para o futuro dos ambientes amazônicos e é um dos mais importantes produtos deste esforço”, destacou a pesquisadora Maria Teresa Fernandez Piedade, que também assina o artigo.

Próximos passos

A Fase 3 do Projeto PELD foi aprovada pelo CNPq e pela Fapeam recentemente, com o título ‘Sítios demonstrativos de ecossistemas de áreas úmidas oligotróficas pristinos e impactados na Amazônia Central: encontrando tendências e preenchendo lacunas’. Nesta fase serão testadas algumas hipóteses formuladas na síntese elaborada, e os estudos integrarão outros componentes, como epífitas, relações entre árvores e fungos, árvores e peixes e impactos socioambientais.

O objetivo é criar um sítio demonstrativo que possa fornecer para vários grupos da sociedade (cientistas, gestores ambientais, tomadores de decisão, ensino de diversos níveis, populações tradicionais e outros) um conhecimento científico integrado sobre a biodiversidade e as inter-relações de componentes-chave da biota, sobre processos e serviços ecossistêmicos, integrando também aspectos socioambientais e políticas públicas.

Da Ascom/Inpa

Foto e imagem: Jochen Schöngart

“A melhor tática é apostar em todas as vacinas”, afirma Miguel Nicolelis

Para o neurocientista, as autoridades não devem descartar nenhum imunizante que está sendo desenvolvido para conter o avanço do novo coronavírus

Considerado pela Scientific America um dos 20 cientistas mais influentes do mundo, o neurocientista Miguel Nicolelis comparou a busca pela vacina contra o novo coronavírus a uma corrida de cavalos. Para ele, não se pode descartar nenhuma hipótese entre as medicações que estão sendo pesquisadas. Coordenador do Comitê Científico do Consórcio do Nordeste, Nicolelis participou nesta quinta-feira (29) da videoconferência (webinar) “Cérebro, o criador do universo e a Comunicação”, transmitida pela In Press Oficina, e falou sobre ciência, o funcionamento do cérebro e fake news.

“Acredito piamente que a vacina é o grande trunfo que vamos ter para reduzir a taxa de transmissão. A vacina é como corrida de cavalos. Tem 15 cavalos na raia e você de antemão não sabe que cavalo vai ganhar. A melhor tática é apostar em todos. Enquanto ela [vacina] não vem, em teoria teríamos que manter o que funciona, o isolamento”, afirma o Nicolelis.

Em confinamento no seu apartamento em São Paulo desde o início da pandemia, o neurocientista crê que o Brasil falhou desde o início, principalmente por ignorar os avisos externos e minimizar a gravidade da doença. “É a maior tragédia humana da história do Brasil num único evento. Nos deparamos com um sistema e instituições que negaram a gravidade da pandemia. Perdemos a guerra no começo”, diz Nicolelis.

A pandemia colocou o planeta na maior crise dos últimos 100 anos e, segundo ele, comprovou a fragilidade do modelo adotado pela sociedade moderna. “Estamos vivendo momentos épicos da história. Um pacotinho nanométrico de gordura e proteína, com um filete de RNA dentro, pôs a humanidade de joelhos, a ponto de estarmos enfrentando a maior crise econômica, maior que a depressão dos anos 30”, compara.

Entretanto, a vulnerabilidade do sistema não foi o único responsável pelas milhares de mortes causadas pela Covid-19. Nicolelis crê que a disseminação de fake news em larga escala contribuiu decisivamente para ampliar o alcance da pandemia.

“É por isso que muita gente morreu na pandemia. Nós estamos precisando de uma vacina num momento que o jornalismo sério e profissional sofre os maiores ataques da história. Esse processo acelerou com a criação de mídias de massa que permitem que essas notícias se espalhem. O cérebro é mais propenso à fake news do que verdades. E esse é o grande problema do mundo atual”, avalia.

Na mesma direção, a sócia-diretora da In Press Oficina, Patrícia Marins, resume em poucas palavras o cenário criado pelo coronavírus: “a pandemia é também uma crise de confiança, uma guerra de narrativas e desencontros”.

Participaram da entrevista a sócia-diretora da In Press Oficina, Patrícia Marins; a Diretora de Curadoria e Novos Produtos, Miriam Moura; e a Diretora de Relacionamento com o Poder Público, Fernanda Lambach.

O cérebro como criador do universo

Professor da Universidade Duke, nos Estados Unidos, Nicolelis é autor do livro “O Verdadeiro Criador de Tudo – Como o Cérebro Humano Esculpiu o Universo como Nós o Conhecemos”, no qual propõe que o cérebro humano é o verdadeiro criador do universo.

“Para o universo ter significado ele precisa de um intérprete. Não sabemos se existe outra forma inteligente, a nossa melhor escolha para o centro do universo é a mente humana. A brainet é o mecanismo que permitiu criar os grupos sociais mais produtivos. Mitos, deuses, sistemas políticos e dinheiro vêm da mente humana. Nós vivemos imersos na nossa criação”, explica.

Diante dessa teoria de que o cérebro é o centro do universo, Nicolelis defende que a inteligência artificial jamais será capaz de superá-lo. “Dar um download nas nossas memórias e deixar num DVD nunca vai acontecer, porque as memórias são analógicas e depositadas nas sinapses dos neurônios”, diz.

Defensor de uma sociedade matriarcal, como ele mesmo se definiu, o neurocientista ainda fez um contraponto ao historiador e filósofo israelense Yuval Harari, autor do best-seller internacional “Sapiens: Uma breve história da humanidade”, que aborda desde a evolução arcaica da espécie humana na idade da pedra, até o século XXI.

“A minha visão de mundo do Yuval é completamente diferente. Eu gostei muito do Sapiens, achei que ele fez um trabalho muito bom de simplificar ideias complexas. Mas acho que ele cometeu alguns erros de análise e visão, como quando ele diz que os impérios eram inevitáveis. Eu discordo frontalmente. Inclusive eu quero a volta do matriarcado do neolítico superior”, sintetiza Miguel Nicolelis.

Fotos: Reprodução Videoconferência
Texto: Divulgação

Novos caminhos da oncologia

Por Ramon Andrade de Mello (*)

Os avanços da ciência têm proporcionado respostas para diversos males que afligem a população. Nessa pandemia, por exemplo, a agilidade dos cientistas na produção de uma vacina para combater o novo coronavírus superou as expectativas. Os resultados podem trazer alento às pessoas que enfrentam a Covid-19.

Nos próximos anos, a ciência deve continuar oferecendo importantes respostas para as doenças que devemos enfrentar num futuro bem próximo. O envelhecimento da população trará profundos impactos na saúde. Para o triênio 2020-2022, as estimativas brasileiras apontam o registro de 625 mil novos casos de câncer no período, excluindo os casos de câncer de pele não melanoma.

Para superar esse novo panorama, pesquisadores de todo o mundo têm se lançado na busca de medicamentos e procedimentos capazes de mudar a abordagem de tratamento das pessoas acometidas por diversos tumores. Na área de oncologia, as terapias genéticas vêm se mostrando o melhor caminho pelos cientistas. Elas atuam nas mutações dos genes das células defeituosas para eliminá-las, uma técnica complementar aos métodos tradicionais – quimioterapia, radioterapia ou cirurgia.

Para quem considera que esses procedimentos ainda estão distantes da nossa realidade, vale ressaltar que o Brasil segue a tendência mundial na busca do tratamento contra o câncer e estudos pioneiros, como os iniciados na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), vão sequenciar o código genético de pessoas não fumantes acometidas por câncer de pulmão. A proposta da pesquisa é identificar os fatores de risco dessa população e apontar os tratamentos mais adequados para muitos casos da doença, com medicamentos que ofereçam maior poder de precisão e menores efeitos colaterais. Denominados de terapias-alvo, esses tratamentos atuam diretamente nas moléculas indispensáveis para as atividades das células cancerígenas, freando a sua expansão.

A ciência e os pacientes também comemoram os bons resultados da imunoterapia, uma técnica que estimula as próprias células de defesa contra o câncer. A escolha do melhor procedimento depende de uma avaliação minuciosa da saúde de cada paciente, realizada por meio de exames clínicos, entre outros processos. Esse método estimula o sistema imunológico no combate às células cancerígenas, bloqueando as engrenagens que elas usam para enganar as defesas com a liberação de proteínas, que se encaixam em receptores dos linfócitos T. Com a técnica, eles identificam e ordenam que outras células destruam os patógenos, que são agentes infecciosos.

Os cientistas já conseguem inclusive fazer a mutação em laboratório dos linfócitos T. Essa alteração ajuda a estimular no reconhecimento das células tumorais quando eles são reintroduzidos no paciente. A dificuldade do tratamento é identificar as alterações precisas que permitam ser aplicadas como alvos, pois o câncer é uma doença multifatorial e de mecanismos moleculares complexos, que se relacionam entre si para manter a célula maligna atuante.

As descobertas trazem vantagens como a redução significativa dos efeitos colaterais dos métodos tradicionais, como a quimioterapia. O sucesso dessas novas técnicas já permite vislumbrar, num horizonte de curto e médio prazos, a abordagem do câncer como uma doença crônica, mas ao mesmo tempo controlável quando bem acompanhada, assim como hoje ocorre com a hipertensão ou a diabetes. Os novos passos da ciência na área de oncologia reforçam nosso otimismo de que a cura para muitas doenças não é apenas um sonho.

(*) Ramon Andrade de Mello, médico oncologista, professor da disciplina de oncologia clínica da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), da Uninove (Universidade Nove de Julho) e da Escola de Medicina da Universidade do Algarve (Portugal).

Foto: Divulgação/ExLibris
Ilustração: Gerd Altmann/Pixabay

Temporada de fogo começa em alta na Amazônia

O período seco na Amazônia – quando, em 2019, foram registradas queimadas de dimensões trágicas – está começando com dados alarmantes. O número de queimadas entre 1 e 21 de junho de 2020 é o maior dos últimos 10 anos nesse período – e ficou 50% acima da média dos 10 anos anteriores (2010 a 2019), que foi de 979.

Nos primeiros 21 dias de junho, foram detectados 1.469 focos de queimadas no bioma Amazônia, 30% a mais que no mesmo período de 2019, quando 1.125 focos foram registrados pelo Inpe. Desses 1.469 focos de queimadas detectados na Amazônia entre 1 e 21 de junho de 2020, 63% ocorreram no Mato Grosso (915).

Esses são os dados mais recentes disponibilizados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Somados aos dados de desmatamento recente, este aumento no número de focos em um mês que historicamente é mais baixo anuncia o que está por vir.

Desmatamento

Entre 1º de janeiro e 31 de maio de 2020, houve alertas de desmatamento para 2.032 km2 na Amazônia Legal, o maior número registrado para o período desde 2015. E o corte raso na floresta amazônica continua subindo.

A ameaça é que o desmate deste ano supere os 10.129 km2 medidos no ano passado, na maior taxa desde 2008 e mais do que o dobro da taxa medida em 2012.

Se olharmos de agosto de 2019 a maio de 2020 com base nos dados do Deter, do Inpe, o desmatamento foi de 6.504 km2, 78% a mais em comparação ao período anterior (agosto de 2018 a maio de 2019), quando foram desmatados 3.654 km2. Esse período de 10 meses exclui os meses de junho e julho, quando o desmatamento é historicamente mais alto.

Saúde pública

Vistas isoladamente, as queimadas representam graves riscos à saúde da população. Um dos efeitos é o aumento do registro de internações hospitalares por doenças respiratórias. Estudo da Fundação Oswaldo Cruz constatou que o número de crianças internadas dobrou entre maio e junho de 2019 – no início do período das queimadas, numa amostra de 100 municípios da Amazônia Legal. Foram 2,5 mil internações a mais por mês, o que teria custado R$ 1,5 milhão extras ao Sistema Único de Saúde. E não são apenas as crianças que sofrem. “As queimadas na Amazônia representam um grande risco à saúde da população. Os poluentes emitidos por essas queimadas podem ser transportados a grande distância, alcançando cidades distantes dos focos de queimadas”, diz o informe do Observatório de Clima e Saúde, ligado à Fiocruz. 

Foto: Araquém Alcântara/WWF Brasil

Cientistas mapeiam grilagem em florestas públicas na Amazônia

Um novo artigo científico de autores brasileiros, publicado na última segunda-feira (23) na revista “Land Use Policy”, mapeia a grilagem em florestas públicas não-destinadas na Amazônia. Dos 49,8 milhões de hectares de florestas sob responsabilidade estadual e federal, mas ainda não alocados a nenhuma categoria de uso, 11,6 milhões de hectares foram declarados irregularmente como imóveis rurais, de uso particular, no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (CAR). Essa área equivale a dois estados do Rio de Janeiro.

O impacto da grilagem se traduz facilmente em desmatamento. Nessas áreas, os pesquisadores identificaram 2,6 milhões de hectares derrubados até 2018, uma área do tamanho de Sergipe. Tal destruição gerou a emissão de 1,2 bilhão de toneladas de CO2, o principal gás do efeito estufa. Oitenta por cento da área desmatada (2,1 milhões de hectares) apresenta registro no CAR, demonstrando a intenção de uso privado de uma área pública.

Se toda a área registrada até hoje como propriedade privada fosse legalizada, de 2,2 a 5,5 milhões de hectares poderiam ser derrubados nos próximos anos – isso seguindo os limites de desmatamento definidos pelo Código Florestal, quando muitas vezes o desmatamento é maior que o permitido.

Nos últimos anos, a grilagem de florestas não-destinadas aumentou. Em 2019, foi a categoria fundiária onde mais se derrubou floresta na Amazônia, de acordo com dados do sistema de alertas de desmatamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Deter. A tendência se mantém em 2020.

Passo a passo

Para fazer a análise, os pesquisadores primeiro limparam as sobreposições das florestas não-designadas no Cadastro Nacional de Florestas, do Serviço Florestal Brasileiro, que conta com 62 milhões de hectares, com outras áreas na base fundiária da Amazônia. Com isso, chegou-se a 49,8 milhões de hectares de florestas públicas, próxima ao tamanho da Espanha, que ainda não foram destinadas para proteção ou uso sustentável de seus recursos naturais, como previsto na Lei de Gestão de Florestas Públicas, de 2006. Deste quinhão, os estados da Amazônia possuem uma área maior (32,7 milhões de ha) do que o governo federal (17,1 milhões de ha).

A grilagem dessas áreas tem como objetivo frequente a especulação fundiária. “Na Amazônia, observamos a seguinte dinâmica: um grileiro entra na área pública e a registra como dele ou no nome de laranjas; depois desmata a área, coloca algumas cabeças de gado para se dizer pecuarista e tenta de todos os jeitos a regularização, ou espera um desavisado comprar a terra. Uma vez vendida, essa terra entra no sistema de produção agropecuária, e o novo dono e seus produtos carregam esse passivo, enquanto o grileiro passa para a próxima área”, explica o pesquisador Paulo Moutinho, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), um dos autores principais do estudo.

O CAR, como registro de regularidade ambiental da propriedade, autodeclarado pelo ocupante, entra nessa equação como uma tentativa de se forjar uma ocupação regular. Por isso, é preciso barrar a validação desses cadastros falsos no sistema. “Esses registros estão na base de dados do governo. Para atuar contra a ilegalidade, é fundamental que o poder público atue para, no mínimo, avaliar a legalidade da ocupação destas áreas, pois isso é roubo do patrimônio público”, diz Moutinho.

A pesquisadora Claudia Azevedo-Ramos, da Universidade Federal do Pará (UFPA), que liderou o estudo, destaca o papel dessas florestas. “É preciso destinar essas florestas para fins de proteção e uso sustentável. Preservar esses ecossistemas significa respeitar os direitos das populações tradicionais e indígenas, que muitas vezes são expulsos pelos grileiros, além de manter a chuva e o clima estáveis, fundamentais para a produção agrícola na Amazônia.”

A despeito de a legislação brasileira definir categorias potenciais de destinação para as florestas públicas, e resguardar essas áreas como domínio público, os autores destacam que, desde 2019, todos os programas de designação dessas áreas foram desmontadas pelos governos federal e estaduais. “Estas florestas pertencem aos brasileiros. Aos governos, cabe protegê-las e garantir que não sejam entregues à especulação e à usurpação de seus recursos naturais. Preservar as florestas públicas é garantir que a Amazônia mantenha suas funções climáticas e socioambientais, com benefícios para todo o planeta”, explica Azevedo-Ramos.

Foto: Ibama/arquivo

Chega de pseudociência

Por Vivaldo José Breternitz*

Nesses tempos de pandemia, aumentou exponencialmente o número de curiosos, políticos, gurus e terapeutas de diversas linhas alternativas, nem sempre honestos, que tem proposto a adoção de práticas e remédios para combater a covid-19. A situação chegou a tal ponto que Donald Trump sugeriu a injeção de desinfetantes, e o que é pior, alguns seguiram a recomendação e morreram.

Essa explosão de desinformação, que a Organização Mundial da Saúde chama de “infodemia”, chamou a atenção de cientistas sérios que passaram a combatê-la, como o professor Timothy Allen Caulfield, da Universidade de Alberta, no Canadá, que é especialista em questões legais, políticas e éticas ligadas à pesquisa médica.

Para Caulfield, devemos deixar de tolerar a pseudociência, especialmente em universidades e instituições de saúde famosas, como a Cleveland Clinic, de Ohio, que legitimam práticas não científicas como o reiki, que pretende “balancear a energia vital que flui através de todas as coisas vivas”.

Também é necessário combater propostas de quiropatas, naturopatas, herbalistas, consteladores e “terapeutas holísticos”, versões modernosas das benzedeiras do tempo de nossas avós, que estão oferecendo produtos e serviços destinados a combater a pandemia – precisamos reconhecer que ajustamentos da espinha dorsal, alinhamentos dos chakras, injeções de vitaminas e práticas similares são absolutamente inúteis para esse fim.

Talvez essas coisas possam funcionar como placebos e aliviar a tensão dos doentes, mas em termos práticos atrapalham o desenvolvimento da pesquisa científica séria e confundem os leigos, ao misturar conceitos díspares como física quântica, células tronco e outros.

Em tempos onde há pessoas que são contra vacinas ou negam que o clima está mudando, pode parecer difícil combater a desinformação gerada pelos algoritmos que governam as redes sociais e por celebridades de diversas áreas não ligadas à ciência e que acabam divulgando pseudociência.

Esperemos que um dos legados da pandemia seja o reconhecimento de que tolerar a pseudociência pode fazer muito mal a todos.

* Vivaldo José Breternitz é doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, professor de Planejamento Estratégico e Sistemas Integrados de Gestão da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Cirurgia robótica e videolaparoscopia ganham espaço na urologia

Os avanços tecnológicos em saúde têm trazido importantes benefícios e mais qualidade de vida aos pacientes. No caso da urologia, destacam-se melhorias no campo cirúrgico, tais como as cirurgias robóticas e videolaparoscopias, ambas consideradas minimamente invasivas e com menos efeitos colaterais e sequelas associadas. O urologista da Urocentro Manaus, Dr. Giuseppe Figliuolo, explica que os procedimentos são indicados para o tratamento de diversas alterações, entre elas, os cânceres de próstata, rins e cálculos urinários.

“Hoje, em Manaus, não dispomos de cirurgia robótica nas unidades de saúde. Porém, nos antecipamos na Urocentro, por sabermos dos benefícios desses procedimentos, e celebramos parcerias com unidades de referência em São Paulo e no Rio de Janeiro, que dispõem dessa tecnologia. Além disso, passamos por treinamentos na área, agregando valor às terapias ofertadas hoje no mercado local”, frisou.

De acordo com ele, além de ser mais rápida, a cirurgia robótica é feita através de pequenas incisões e, sendo assim, apresenta menos risco de sangramento durante o procedimento e também no pós-cirúrgico. “A recuperação é mais rápida e as chances de sequelas são menores”, afirmou.


O especialista deu como exemplo as modalidades voltadas para o tratamento das neoplasias malignas de próstata, consideradas as mais incidentes na população masculina do Amazonas, com previsão de 580 casos/ano, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), subordinado ao Ministério da Saúde.

“O robô, que é guiado por um médico, que fica em uma cabine dentro do centro cirúrgico. O equipamento tem uma precisão maior na hora da extração do tumor. Por isso, os riscos de se desenvolver incontinência urinária e disfunção erétil pós-cirurgia, são reduzidos, já que as pinças são mais direcionadas, ocasionando menos dano tecidual”, explicou Figliuolo.

Para procedimentos que implicam na ressecção de tecidos maiores, o procedimento também pode ser aplicado. “No caso do câncer renal, a nefrectomia radical, ou seja, a retirada total de um dos rins, também é possível através da tecnologia robótica. Outra modalidade bastante utilizada é a vídeolaparoscopia, que utiliza pinças e pequenas incisões, com a vantagem de ter uma recuperação mais rápida. Em pouco tempo, o paciente retorna às suas atividades cotidianas, sem prejuízos maiores”, assegurou.

De acordo com Giuseppe Figliuolo, ambos os procedimentos só são indicados após uma análise minuciosa, que inclui exames de imagem, avaliação médica, exames complementares laboratoriais, entre outros.

“É importante frisar que todos os procedimentos, cirúrgicos ou não, vão depender do estadiamento da doença. Ou seja: da extensão que ela apresenta. Quando mais cedo as alterações são detectadas, maiores as chances de cura e de procedimentos menos invasivos. Por isso, destacamos sempre a necessidade das avaliações anuais, que buscam investigar problemas assintomáticos, que se desenvolvem de forma lenta e que só são evidenciados, geralmente, quando o paciente passa a sentir dor, nas fases intermediária ou avançada”, reforçou o especialista, que é membro da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) e tem mais de 20 anos de experiência na área.

Foto: divulgação

Represas andinas planejadas para Peru e Bolívia ameaçam ecossistema fluvial da Amazônia

Seis hidrelétricas planejadas para serem construídas nos maiores rios saindo das montanhas andinas no Peru e na Bolívia são consideradas a maior ameaça ao ecossistema fluvial amazônico. A conclusão é do cientista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC), o biólogo com doutorado em ecologia Bruce Forsberg. O assunto foi debatido na estreia dos Seminários da Amazônia, que retornaram com nova roupagem após seis anos.

As montanhas andinas são fonte da maior parte de nutrientes e sedimentos que banham as várzeas dos rios da Amazônia, chegando até o final onde são depositados numa área chamada de delta, no final do rio Amazonas, desembocando no mar. Essas barragens novas ameaçam cortar esse fluxo.

Das seis hidrelétricas, quatro serão construídas no Peru (TAM 40, no rio Ucayali; Pongo de Aguirre, no Rio Huallaga; Pongo de Manseriche, no rio Maranon, e Inambari, no rio Inambari) e duas na Bolívia (Agosto Del Bala, no rio Beni; e Rositas, no rio Grande). Juntas devem produzir 10.000 megawatts e a maioria será construída em parceria com Brasil.

Impactos

De acordo com Forsberg, os impactos ambientais dessas hidrelétricas serão muito maiores no Brasil do que no Peru e Bolívia. “Esses reservatórios vão barrar o fluxo dos sedimentos e nutrientes Andinos, que sustentam a produção pesqueira e agrícola das várzeas, que alimenta nossos ribeirinhos”, afirmou Forsberg, que é especialista em ecossistemas fluviais.

Além da redução de quase 70% no fluxo de sedimentos e nutrientes que abastecem os rios da região e o delta do rio Amazonas, o pulso de inundação (subida e descida do nível do rio) será diminuído, causando impacto sobre a flora das várzeas e sobre os peixes que dependem dessa flora para sua alimentação e reprodução.

Outro impacto importante é sobre o mercúrio nos rios, com contaminação prevista acima e abaixo das novas barragens, especialmente no peixe que será consumido pelas populações nessas regiões. O mercúrio é um metal tóxico e pode trazer problemas de saúde quando encontrado em concentrações muito altas no organismo, comprometendo o sistema neurológico, podendo causar tremores nas mãos e dificuldade motora, causando até a morte em casos extremos.

Metilmercúrio

Segundo Forsberg, o mercúrio está presente naturalmente nos rios da Amazônia, que tem solos ricos com esse metal, porém está presente principalmente na forma inorgânica, apresentando pouco risco para os seres humanos. O garimpo de ouro também contribui para o mercúrio nos rios, mas não é a fonte predominante.

O mercúrio só apresenta riscos à saúde humana quando é transformado na forma orgânica, Metilmercúrio. Isso aconteça nos reservatórios quando a floresta da terra firme é alagada e entra em decomposição, tirando o oxigênio da água e promovendo a transformação do mercúrio inorgânico em metilmercúrio. “Uma vez formado, o metilmercúrio acumula na cadeia alimentar, contaminando o peixe e o povo que come esse peixe. Esse impacto é sentido tanto no reservatório quanto no rio à jusante”, explicou o pesquisador.

Esse problema foi verificado no reservatório de Balbina, em Presidente Figueiredo-AM, fechado em 1988. Durante os primeiros dez anos, os níveis de mercúrio no tucunaré e nos cabelos de mulheres que consumiam esse peixe aumentaram muito. O nível em cabelos chegou a um valor considerado perigoso para mulher grávida (7,5 partes por milhão – ppm), depois começou a cair (5 ppm, hoje), mas ainda não voltou ao nível original A Organização Mundial de Saúde (OMS) sugere um valor máximo de 6 ppm de mercúrio em cabelos das mulheres lactantes.

As usinas hidrelétricas também vão aumentar as emissões regionais de gases de efeito estufa (CO2 e metano), que são contabilizados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e outras organizações globais.

Enfrentamento

Para enfrentar a situação, Forsberg sugere que os pesquisadores trabalhem em conjunto, de forma transdisciplinar, em colaborações transnacionais, envolvendo parceiros governamentais e não governamentais de todos os países envolvidos.

“Se queremos ter impacto, não adianta só fazermos nossas pesquisas, teses, artigos. Temos de levar essas informações para os governantes, para a sociedade, para criar consciência e ações efetivas sobre esses problemas”, disse Forsberg. “E vamos começar a falar sobre alternativas, outras matrizes, como a solar, que está com o custo por megawatt já quase chegando ao mesmo patamar do megawatt produzido por hidrelétrica”, ressaltou o pesquisador.

Segundo Forsberg, os projetos das hidrelétricas estão parados, especialmente por problemas de corrupção, mas a qualquer momento os governos e construtoras podem retomar os planos. O motivo é que os reservatórios estão previstos para serem construídos em “gargantas profundas”, em montanha com rio grande passando, que dá garantia de grande produção energética, porém com significativos impactos socioambientais que não foram levados em consideração.

Seminários

Realizado de 1976 a 2013, os Seminários da Amazônia voltam com a proposta de discutir temas de ponta da pesquisa científica do mundo e da Amazônia, com temas provocativos e que estimulam a discussão e o aprendizado.

Agora o tradicional evento científico do Inpa acontece quinzenalmente às quintas-feiras, às 15h, no Auditório da Biblioteca, na avenida André Araújo, 2936, Petrópolis, zona Sul de Manaus. É gratuito e aberto à comunidade. A 2ª edição será no dia 25 de abril com o também palestrante da casa, o pesquisador Charles Clement, que falará sobre “Dez mil anos de domesticação da Amazônia”.

Promovido pela Coordenação de Extensão, os Seminários da Amazônia tem na liderança da Comissão Organizadora as pesquisadoras Rita Mesquita e Cristina Cox Fernandes.

Saiba mais

Artigo científico publicado na Plos One sobre o mesmo assunto da palestrado Dr. Bruce Forsberg pode ser acessado clicando aqui.

Foto: Cimone Barros/Inpa


Estudo do Ipea destaca a relevância do programa de defesa da Amazônia Azul

O atraso na implementação do Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz) pode acarretar importantes efeitos ne­gativos não só para a segurança marítima brasileira, mas também para o desenvolvimento científico-tecnológico do país. É o que aponta estudo recém-lançado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O Programa, iniciado em 2009, passa por uma fase de reformulação desde 2015, decorrente da restrição orçamentária vigente no país.

O trabalho Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul: Soberania, Vigilância e Defesa das Águas Jurisdicionais Brasileiras, coordenado pelo técnico de planejamento e pesquisa do Ipea Israel Oliveira Andrade, ressalta que a extensão da Amazônia Azul – que compreende todo litoral do país e as águas jurisdicionais brasileiras – constitui, por si só, um desafio para a defesa nacional.

Para proteger este espaço marítimo, a Marinha do Brasil tem desenvolvido programas estratégicos, entre eles o SisGAAz, relevante pelas parcerias entre empresas nacionais e estrangeiras que envolvem a transferência de tecnologia e cujo objetivo é desenvolver continuamente sistemas de monitoramento e controle. Neste programa, está previsto também o uso de satélites, radares e equipamentos de sensoriamento por meio da integração de redes de informação e de apoio à decisão.

“Trata-se de ferramenta com alta densidade tecnológica que permite resposta rápida no caso de ameaças, inclusive de tragédias ambientais. Por se tratar de um sistema adaptável e configurável, o SisGAAz beneficia-se dos conceitos de integração de sistemas e interoperabilidade. Pode também contribuir para o aperfeiçoamento do monitoramento aéreo e ambiental, permitir a cooperação com outras instituições do Estado como o Ibama, no combate a ilícitos ambientais, e com a Polícia Federal e Receita Federal, no combate ao tráfico de drogas e contrabando de armas, por exemplo”, explicou Andrade, autor da pesquisa, que teve como coautores Antônio Jorge Ramalho da Rocha e Luiz Gustavo Aversa Franco.

O estudo do Ipea enfatiza que o SisGAAz deve figurar entre as prioridades governamentais por razões econômicas, de soberania e defesa nacional. E manifesta preocupação quanto à contratação de empresas estrangeiras. “Alguns aspectos do programa, como a possível utilização de satélites e o de­senvolvimento de softwares para obtenção de dados, ressaltam a importância do nível de nacionalização das empresas envolvidas. Nesse sentido, a contratação de empresas estrangeiras geraria uma vulnerabilidade, dada a perda de autonomia decorrente da ausência de controle sobre a informação produzida, tornando preferível o uso de recur­sos nacionais”, explicam os pesquisadores.

A Amazônia Azul equivale a mais da metade do território nacional e nela se encontram recursos naturais consideravelmente importantes – cerca de 95% do petróleo e 80% do gás natural produzido pelo país. É, também, rota importante para o comércio marítimo. Por essa área passam aproximadamente 95% da importação e exportação do Brasil, além de linhas de comunicação fundamentais. Há ainda grande concentração populacional nas águas jurisdicionais e forte presença de infraestrutura produtiva brasileira nas regi­ões litorâneas.

Foto: Agência Pará